É muito comum ouvir-se dizer que é em tempos de crise que se vê o melhor das pessoas e que estas alturas mais conturbadas deviam ser vistas não como uma desgraça mas sim como uma grande oportunidade. Esta conversa não é nova, apesar de assistirmos às ondas replicadoras dos influenzers – a palavra vem de obstipação não nasal mas mental – do youtube/facebook/instagram (qualquer que seja o vosso guilty pleasure favorito). Já abordámos exaustivamente esse assunto aqui neste espaço mas nunca é demais insistir em alguns pontos que ganharam ainda mais músculo nas últimas semanas. Se na primeira fase da pandemia podíamos notar uma clara indicação que este não é um vírus democrático, agora que estamos a confinar o desconfinamento é óbvio para quem quiser abrir os olhos que as populações mais afectadas, de forma completamente desproporcional, são – para variar – as mais desfavorecidas: desde aquela que é erroneamente designada como a maior democracia do mundo (1) até ao pântano fétido em que se transformou o outrora país da mamata – isso já acabou, claro, desde o fatídico primeiro de Janeiro do ano passado, com a bênção evangélica – Deo Gratias. (2) Por outro lado, os super-milionários da Terra das Oportunidades© continuam a amealhar (3) como a formiga – se a formiga se chamasse Bezos, Musk, Gates, Zuckerberg ou Yuan.
Diz-se que o mundo vai mudar e as pessoas vão enfim perceber aquilo que realmente importa. Um mar de rosas para enxugar este vale de lágrimas que serve de estágio à eternidade celestial. Não era preciso ser vidente para prever o futuro e ver que quando há muito dinheiro em jogo o que impera é o salve-se quem puder. Ainda andávamos aqui todos de cara à banda a assistir ao início da corrida para ver qual é o laboratório que consegue patentear uma vacina mais rapidamente e agora que se descobriu um medicamento eficaz no tratamento é o que se vê: açambarcamento total pelos Líderes do Mundo Livre© de praticamente todo o stock de remdesivir. Um medicamento que foi desenvolvido – em grande medida – pelo sector público e com financiamento público (4) mas cuja patente foi entregue de mão beijada à gigante farmacêutica Gilead (5) porque a empresa precisa de dinheiro para sobreviver. (6)
Por cá, o nosso amigo Álvaro Covões da promotora Everything Is New continua a espalhar o seu inegável charme, nomeadamente através de uma entrevista que deu ao podcast da Blitz no passado dia 9. (7) Para alguém com o estatuto de Covões já se espera alguma reverência e Mário Rui Vieira não deixou os seus créditos por bocas alheias com uma apresentação bem bajulatória ao Senhor do(s) Espectáculo(s): “Pode até não ser músico mas dá-nos música há décadas e tornou-se à sua maneira uma verdadeira estrela Rock”. Dar música, neste contexto, é uma expressão que assenta às mil maravilhas. A nossa estrela do Rock favorita também não defraudou as expectativas. Se entendermos isso como a persistência nos mesmos erros. É perfeitamente normal as pessoas reflectirem sobre as suas posições, fazerem uma análise introspectiva e corrigirem aquilo que acham que não está correcto. Mas para quê recuar se temos as meninas da claque a puxar por nós? Esse será provavelmente o maior dos problemas (há vários) do jornalismo de hoje, a falta de confronto (as excepções acontecem quando se trata de banalidades sem importância alguma ou quando há uma clara divergência ideológica por resolver). Apontar um microfone a alguém e gravar sem qualquer tipo de questionamento não é jornalismo, é Relações Públicas. Quando alguém dá a entender que o nosso regime totalitário com laivos ditatoriais (os eufemismos) foi uma ditadura de brincar a resposta não é ficar calado. Covões recorda: “Lembro-me, por exemplo, que o meu pai não me deixou ver o Patxi Andión. Acho que já era em Abril, Abril de 74 porque estava na iminência do espectáculo, daquilo dar confusão”. Reacção de Mário Rui Vieira: “Pois”. Álvaro insiste: “Mas o espectáculo aconteceu porque era uma ditadura assim sui generis”. Complementa o jornalista – “sim, era uma ditadura diferente”. Era tão diferente que o mesmo Patxi Andion só conseguiu actuar em Portugal à terceira, pois nas duas anteriores tentativas foi escoltado até à fronteira pela PIDE. (8) As outras ditaduras foram muito piores que em Portugal. Foi a nossa abnegada generosidade que permitiu a chegada da civilização ao Brasil e a África. E estava a correr tão bem! Só os terroristas nativos brasileiros e africanos vieram perturbar a sã convivência que se respirava no Portugal ultra-marino, onde nunca se ouviu falar em descriminação racial nem algo do género.
Mas o melhor exemplo dessa submissão jornalística aos ditames do poder observa-se numa constrangedora conivência na promoção ao trabalho infantil. Podemos recorrer aos mais elaborados exercícios de ginástica mental que isso não vai alterar um milímetro esta verdade universal: em questões civilizacionais básicas como direitos humanos o silêncio é cumplicidade. Como a insistência de Covões neste ponto nunca merece qualquer tipo de indignação, ele segue em frente: “Comecei a trabalhar para aí aos 12 anos, quando se podia. É uma experiência. Eu acho que devia ser obrigatório. Há países como a Suíça onde isso faz parte do currículo escolar, os miúdos desde muito novos começarem a trabalhar. E eu acho que isso só nos faz bem”. O exemplo da Suíça é bem esgalhado, por duas razões. Em primeiro lugar, o sistema educativo na Suíça é o sonho de qualquer país neo-liberal, com a maioria dos alunos a ingressarem num ensino dual, que combina uma componente que tem uma formação mais teórica com outra em ambiente empresarial onde aprendem um ofício. Obviamente que são as empresas quem decide o que se ensina, claro. E se isso vai ter um resultado benéfico em termos estatísticos, com taxas de desemprego jovem historicamente reduzidas, não é menos verdade que chamar a isto ensino vocacional é ligeiramente abusivo. Até porque este tipo de sistema em que as escolas seguem à risca a cartilha dos mercados, não pode deixar de ser profundamente segregador, com uma estratificação social muito rígida na altura do encaminhamento dos alunos para a sua suposta vocação. (9) O segundo ponto curioso no exemplo suíço é a bagagem de vergonha que o país ainda carrega devido às crianças de aluguer. Até ao início dos anos 80 dezenas de milhares de crianças foram retiradas aos pais que, segundo as autoridades, não reuniam as condições para as criar (ou porque eram demasiado pobres ou porque eram moralmente inaptas – as duas coisas estão muitas vezes ligadas em mentes mais depravadas) para trabalhar na agricultura e em fábricas. Um escândalo que obrigou mesmo o governo suíço a vir desculpar-se publicamente em 2013 e o parlamento a aprovar uma lei que em 2016 estabeleceu indeminizações às crianças vítimas deste sistema. (10)
Diz-se que o mundo vai mudar e as pessoas vão enfim perceber aquilo que realmente importa. Um mar de rosas para enxugar este vale de lágrimas que serve de estágio à eternidade celestial. Não era preciso ser vidente para prever o futuro e ver que quando há muito dinheiro em jogo o que impera é o salve-se quem puder. Ainda andávamos aqui todos de cara à banda a assistir ao início da corrida para ver qual é o laboratório que consegue patentear uma vacina mais rapidamente e agora que se descobriu um medicamento eficaz no tratamento é o que se vê: açambarcamento total pelos Líderes do Mundo Livre© de praticamente todo o stock de remdesivir. Um medicamento que foi desenvolvido – em grande medida – pelo sector público e com financiamento público (4) mas cuja patente foi entregue de mão beijada à gigante farmacêutica Gilead (5) porque a empresa precisa de dinheiro para sobreviver. (6)
Por cá, o nosso amigo Álvaro Covões da promotora Everything Is New continua a espalhar o seu inegável charme, nomeadamente através de uma entrevista que deu ao podcast da Blitz no passado dia 9. (7) Para alguém com o estatuto de Covões já se espera alguma reverência e Mário Rui Vieira não deixou os seus créditos por bocas alheias com uma apresentação bem bajulatória ao Senhor do(s) Espectáculo(s): “Pode até não ser músico mas dá-nos música há décadas e tornou-se à sua maneira uma verdadeira estrela Rock”. Dar música, neste contexto, é uma expressão que assenta às mil maravilhas. A nossa estrela do Rock favorita também não defraudou as expectativas. Se entendermos isso como a persistência nos mesmos erros. É perfeitamente normal as pessoas reflectirem sobre as suas posições, fazerem uma análise introspectiva e corrigirem aquilo que acham que não está correcto. Mas para quê recuar se temos as meninas da claque a puxar por nós? Esse será provavelmente o maior dos problemas (há vários) do jornalismo de hoje, a falta de confronto (as excepções acontecem quando se trata de banalidades sem importância alguma ou quando há uma clara divergência ideológica por resolver). Apontar um microfone a alguém e gravar sem qualquer tipo de questionamento não é jornalismo, é Relações Públicas. Quando alguém dá a entender que o nosso regime totalitário com laivos ditatoriais (os eufemismos) foi uma ditadura de brincar a resposta não é ficar calado. Covões recorda: “Lembro-me, por exemplo, que o meu pai não me deixou ver o Patxi Andión. Acho que já era em Abril, Abril de 74 porque estava na iminência do espectáculo, daquilo dar confusão”. Reacção de Mário Rui Vieira: “Pois”. Álvaro insiste: “Mas o espectáculo aconteceu porque era uma ditadura assim sui generis”. Complementa o jornalista – “sim, era uma ditadura diferente”. Era tão diferente que o mesmo Patxi Andion só conseguiu actuar em Portugal à terceira, pois nas duas anteriores tentativas foi escoltado até à fronteira pela PIDE. (8) As outras ditaduras foram muito piores que em Portugal. Foi a nossa abnegada generosidade que permitiu a chegada da civilização ao Brasil e a África. E estava a correr tão bem! Só os terroristas nativos brasileiros e africanos vieram perturbar a sã convivência que se respirava no Portugal ultra-marino, onde nunca se ouviu falar em descriminação racial nem algo do género.
Mas o melhor exemplo dessa submissão jornalística aos ditames do poder observa-se numa constrangedora conivência na promoção ao trabalho infantil. Podemos recorrer aos mais elaborados exercícios de ginástica mental que isso não vai alterar um milímetro esta verdade universal: em questões civilizacionais básicas como direitos humanos o silêncio é cumplicidade. Como a insistência de Covões neste ponto nunca merece qualquer tipo de indignação, ele segue em frente: “Comecei a trabalhar para aí aos 12 anos, quando se podia. É uma experiência. Eu acho que devia ser obrigatório. Há países como a Suíça onde isso faz parte do currículo escolar, os miúdos desde muito novos começarem a trabalhar. E eu acho que isso só nos faz bem”. O exemplo da Suíça é bem esgalhado, por duas razões. Em primeiro lugar, o sistema educativo na Suíça é o sonho de qualquer país neo-liberal, com a maioria dos alunos a ingressarem num ensino dual, que combina uma componente que tem uma formação mais teórica com outra em ambiente empresarial onde aprendem um ofício. Obviamente que são as empresas quem decide o que se ensina, claro. E se isso vai ter um resultado benéfico em termos estatísticos, com taxas de desemprego jovem historicamente reduzidas, não é menos verdade que chamar a isto ensino vocacional é ligeiramente abusivo. Até porque este tipo de sistema em que as escolas seguem à risca a cartilha dos mercados, não pode deixar de ser profundamente segregador, com uma estratificação social muito rígida na altura do encaminhamento dos alunos para a sua suposta vocação. (9) O segundo ponto curioso no exemplo suíço é a bagagem de vergonha que o país ainda carrega devido às crianças de aluguer. Até ao início dos anos 80 dezenas de milhares de crianças foram retiradas aos pais que, segundo as autoridades, não reuniam as condições para as criar (ou porque eram demasiado pobres ou porque eram moralmente inaptas – as duas coisas estão muitas vezes ligadas em mentes mais depravadas) para trabalhar na agricultura e em fábricas. Um escândalo que obrigou mesmo o governo suíço a vir desculpar-se publicamente em 2013 e o parlamento a aprovar uma lei que em 2016 estabeleceu indeminizações às crianças vítimas deste sistema. (10)
Isto é o que acontece quando as estacas onde assenta a nossa civilização são feitas deste material: “como a base da nossa sociedade é a economia sempre me interessei muito”. O que entusiasma Covões é a Gestão, “acima de tudo. É o dia-a-dia, quer dizer aquilo que nós fazemos no nosso dia-a-dia. Aquilo que nós muitas vezes chamamos a gestão de mercearia, que o merceeiro faz. No fundo as grandes teorias de gestão nas grandes empresas é rigorosamente igual. De uma forma mais ordenada mas o pensamento é muito igual”. A melhor maneira de perceber esta igualdade entre a gestão de mercearia e a Everything Is New é a história da devolução do dinheiro dos bilhetes, empurrada com a barriga lá para Janeiro de 2022. Mais do que uma linha de crédito bonificado, é um verdadeiro empréstimo mal encapotado com taxas de juro extremamente favoráveis. A culpa por uma vez não é da China, é dos alemães. “Até foi o próprio governo alemão que pediu autorização à Comissão Europeia para manter porque há uma preocupação muito grande. Isto é uma indústria. O fluxo de caixa foi interrompido e há organizações que não tinham caixa suficiente para fazer face. Era uma situação absolutamente extraordinária em que fazia todo o sentido se a pessoa comprou então vai ver na próxima vez quando for possível ver. E portanto muitos países da Europa seguiram esta política do voucher para os grandes eventos no sentido de proteger também para que as empresas continuem”. Esta solução não é de todo consensual, com muitos festivais espanhóis, só para citar o exemplo mais próximo, a devolverem o dinheiro dos bilhetes; já para não falar em toda a controvérsia com as companhias aéreas. (11) Uma coisa é certa – todos queremos que as empresas continuem a funcionar, de facto. Mas não deixa de ser curioso que sejam os mais liberais a pedinchar por ajuda do mesmo Estado que estão sempre a criticar. E também é divertido imaginar o que seria um gestor de mercearia ficar com o dinheiro dos clientes que pagaram produtos que só vão existir daqui a um ano, na melhor das hipóteses.
Aqui no caso dos promotores e de todas as empresas que gravitam à sua volta o problema prende-se com a pretensa impossibilidade de fazer concertos. Daí haver um tumulto nacional com a Festa do Avante que Covões não acredita que aconteça. “Não podemos falar sobre o que vai acontecer daqui a dois meses. Nem sabemos o que vai acontecer daqui a uma semana. Mas se a situação estiver como está hoje, obviamente não vai acontecer” antecipa, exaltando “a postura muito responsável” que o PCP “sempre teve”. Vamos passar à frente do facto mais óbvio de todos, que é não se saber ao certo se vai efectivamente acontecer. A celeuma advém mais ou menos desta premissa. Se os festivais estão proibidos como é que deixam fazer aquilo? Os partidos podem tudo, as influências, os compadrios. Porque se há alguém que tem uma influência gigante na sociedade portuguesa é a Esquerda, no geral, e o PCP em particular. A diferença maior aqui é só uma, passa pela vontade em fazer o festival. Os organizadores da Festa do Avante têm vontade de fazer o seu “festival”. Será que se pode dizer o mesmo dos grandes festivais de Verão em Portugal? Existia efectivamente vontade por parte dos associados da APEFE de prosseguir com os seus maiores eventos, de acordo com as exigências da DGS, em termos sanitários e de distanciamento social? A proibição dos festivais foi uma maldição para os promotores ou uma bênção para evitar o cancelamento? Até porque, a fazer fé nas palavras de Álvaro Covões, “hoje pode-se fazer concertos. Não são assim tão difíceis. O mais complexo é gerir fluxos de circulação. É muito mais seguro ir a um espectáculo segundo as regras do que ir a um supermercado”.
Aquilo que neste momento mais preocupa Covões é – em bom português – a chibaria. “Cada um está a disparar para seu lado a dizer disparates que é para avisar os estrangeiros para não virem a Portugal. Isto é um disparate total. Os danos em Economia já vão ser tão grandes, não façam pior, não tornem isto pior. O problema é que nós não temos, sob o ponto de vista individual, tanto a sociedade civil como política, não tem sentido de responsabilidade nem sentido de Estado. Porque os disparates que já se disseram sobre o estado na região de Lisboa, as críticas que já foram feitas conduziram a este desastre total que é… já não é só em Inglaterra, já é a Bélgica, já é a Escócia, já é a Finlândia, já é um conjunto de países que desaconselham a vinda a Portugal quando Portugal se calhar ainda é muito mais seguro que os próprios países que estão a desaconselhar”. A velha solução que passa por matar o mensageiro para esconder a mensagem. “Mas isto tudo acontece só porque as pessoas não sabem estar caladas e às vezes faz-me lembrar o Rei Juan Carlos quando um dia – e com razão – disse para um homem que destruiu um país... É uma metáfora muito interessante porque de facto ele ainda não tinha destruído o país. A Venezuela hoje está destruída sob o ponto de vista económico e social e ele já altura disse porque no te callas, hombre?” Antigamente é que era bom, quando a Venezuela era um bordel para os ocidentais proxenetarem à vontade. Como se atrevem os favelados a exigir acesso à educação, habitação ou saúde? Quem é que a maioria dos venezuelanos pensa que é para exigir alguma dignidade ou – o espanto – saírem da pobreza? (12) “Devíamos passar essa mensagem. Porque é que não se calam todos? Os opinadores nas televisões e nas rádios e nos jornais, os políticos. Calem-se. Há coisas que não se dizem publicamente. Claro. Obviamente que não podemos fechar os olhos, temos que as discutir em privado”. Um aforismo para memória futura: A liberdade de expressão é um direito fundamental a não ser que esteja a prejudicar a economia. Nesse caso usa-se uma rolha.
Ninguém está aqui à espera de encontrar a perfeição absoluta – isso não existe. Não é possível sermos 100% impolutos mas ao menos um bocadinho de decência – já não peço mais nada. Algo que suscite uma reacção diferente das explosivas interjeições vernaculares mais boçais. Vamos deixar de lado o Álvaro Covões e dar ali uma volta a Coimbra para tentar apanhar um bocadinho de ar fresco. Criada em 2012 pela Sara (que alguns de vocês devem conhecer como Sara Steel, a voz dos THÜNNDRESS, anteriormente conhecidos como The Unholy), a GO! Walks Portugal é uma empresa de animação turística, segundo o léxico oficial. Como isso me faz lembrar rebanhos de turistas apostados em ingerir a maior quantidade de álcool possível no mais curto espaço de tempo – Magaluf-style – eu prefiro chamar-lhe Turismo Cultural, até porque é uma expressão que o nosso Álvaro tanto gosta de utilizar. Por isso e para desenjoar desta conversa dos grandes magnatas da indústria do espetáculo vamos chamar à discussão a GO! Walks Portugal, com a Sara e o Nuno (a outra metade da GWP e dos THÜNNDRESS) e tentar responder a uma dúvida premente: será uma fatalidade do destino todos os patrões serem assim? Sempre deixando bem vincada a diferença titânica de escala para uma empresa como a Everything Is New. Empresas com dimensões diferentes têm necessariamente modelos de funcionamento diversos. No entanto, mais importante do que comparar PMEs com micro-empresas, importa aqui comparar formas diferentes de olhar para a sociedade, com tudo o que isso acarreta em termos sociais e humanos. Porque a responsabilidade social não pode estar refém do volume de receitas.
Sem rodeios nem falinhas mansas vamos começar já ao ataque. Vocês sentem o estigma de ser patrões? As pessoas olham para vocês na rua e apupam-vos? Ou quando sobem a um palco com a vossa banda cospem com escárnio: “Olha os empresários! Bandidos!!!” Acontece-vos assim tantas vezes? “Nada disso!” Sara responde com uma gargalhada. “Eu nem sei bem o que significa o estigma de ser patrão”, confessa. “Limitei-me a acordar um dia e decidir que ia fazer só o que gostava e isso por acaso implicou abrir uma empresa. Nessa altura já andava a dar uns toques com o pessoal, num ambiente ainda muito subterrâneo (literalmente, uma garagem num piso -5 abaixo do Rio Mondego)”. O underground – mais do que a idade – é um posto. “Acho que como era muito nova (ainda sou, mas menos!) os outros patrões de negócios relacionados não me levavam muito a sério… mas eu sabia o que queria fazer e felizmente tive que lhes mostrar que estavam errados! Claro que ser empresária tem as suas implicações no que respeita ao tempo disponível para uma banda: tempo de medida temporal, mas também de disponibilidade mental, por isso é natural que as coisas não fluam tão rapidamente quanto eu gostaria”. Nuno não resiste em meter o bedelho. “Apesar da pergunta estar no plural quero esclarecer que não sou patrão… na realidade sou um escravo do Heavy Metal, e é assim que vai ser até ao final dos tempos!”. Para quem quiser entender, isto é todo um Manifesto.
Aqui no caso dos promotores e de todas as empresas que gravitam à sua volta o problema prende-se com a pretensa impossibilidade de fazer concertos. Daí haver um tumulto nacional com a Festa do Avante que Covões não acredita que aconteça. “Não podemos falar sobre o que vai acontecer daqui a dois meses. Nem sabemos o que vai acontecer daqui a uma semana. Mas se a situação estiver como está hoje, obviamente não vai acontecer” antecipa, exaltando “a postura muito responsável” que o PCP “sempre teve”. Vamos passar à frente do facto mais óbvio de todos, que é não se saber ao certo se vai efectivamente acontecer. A celeuma advém mais ou menos desta premissa. Se os festivais estão proibidos como é que deixam fazer aquilo? Os partidos podem tudo, as influências, os compadrios. Porque se há alguém que tem uma influência gigante na sociedade portuguesa é a Esquerda, no geral, e o PCP em particular. A diferença maior aqui é só uma, passa pela vontade em fazer o festival. Os organizadores da Festa do Avante têm vontade de fazer o seu “festival”. Será que se pode dizer o mesmo dos grandes festivais de Verão em Portugal? Existia efectivamente vontade por parte dos associados da APEFE de prosseguir com os seus maiores eventos, de acordo com as exigências da DGS, em termos sanitários e de distanciamento social? A proibição dos festivais foi uma maldição para os promotores ou uma bênção para evitar o cancelamento? Até porque, a fazer fé nas palavras de Álvaro Covões, “hoje pode-se fazer concertos. Não são assim tão difíceis. O mais complexo é gerir fluxos de circulação. É muito mais seguro ir a um espectáculo segundo as regras do que ir a um supermercado”.
Aquilo que neste momento mais preocupa Covões é – em bom português – a chibaria. “Cada um está a disparar para seu lado a dizer disparates que é para avisar os estrangeiros para não virem a Portugal. Isto é um disparate total. Os danos em Economia já vão ser tão grandes, não façam pior, não tornem isto pior. O problema é que nós não temos, sob o ponto de vista individual, tanto a sociedade civil como política, não tem sentido de responsabilidade nem sentido de Estado. Porque os disparates que já se disseram sobre o estado na região de Lisboa, as críticas que já foram feitas conduziram a este desastre total que é… já não é só em Inglaterra, já é a Bélgica, já é a Escócia, já é a Finlândia, já é um conjunto de países que desaconselham a vinda a Portugal quando Portugal se calhar ainda é muito mais seguro que os próprios países que estão a desaconselhar”. A velha solução que passa por matar o mensageiro para esconder a mensagem. “Mas isto tudo acontece só porque as pessoas não sabem estar caladas e às vezes faz-me lembrar o Rei Juan Carlos quando um dia – e com razão – disse para um homem que destruiu um país... É uma metáfora muito interessante porque de facto ele ainda não tinha destruído o país. A Venezuela hoje está destruída sob o ponto de vista económico e social e ele já altura disse porque no te callas, hombre?” Antigamente é que era bom, quando a Venezuela era um bordel para os ocidentais proxenetarem à vontade. Como se atrevem os favelados a exigir acesso à educação, habitação ou saúde? Quem é que a maioria dos venezuelanos pensa que é para exigir alguma dignidade ou – o espanto – saírem da pobreza? (12) “Devíamos passar essa mensagem. Porque é que não se calam todos? Os opinadores nas televisões e nas rádios e nos jornais, os políticos. Calem-se. Há coisas que não se dizem publicamente. Claro. Obviamente que não podemos fechar os olhos, temos que as discutir em privado”. Um aforismo para memória futura: A liberdade de expressão é um direito fundamental a não ser que esteja a prejudicar a economia. Nesse caso usa-se uma rolha.
Ninguém está aqui à espera de encontrar a perfeição absoluta – isso não existe. Não é possível sermos 100% impolutos mas ao menos um bocadinho de decência – já não peço mais nada. Algo que suscite uma reacção diferente das explosivas interjeições vernaculares mais boçais. Vamos deixar de lado o Álvaro Covões e dar ali uma volta a Coimbra para tentar apanhar um bocadinho de ar fresco. Criada em 2012 pela Sara (que alguns de vocês devem conhecer como Sara Steel, a voz dos THÜNNDRESS, anteriormente conhecidos como The Unholy), a GO! Walks Portugal é uma empresa de animação turística, segundo o léxico oficial. Como isso me faz lembrar rebanhos de turistas apostados em ingerir a maior quantidade de álcool possível no mais curto espaço de tempo – Magaluf-style – eu prefiro chamar-lhe Turismo Cultural, até porque é uma expressão que o nosso Álvaro tanto gosta de utilizar. Por isso e para desenjoar desta conversa dos grandes magnatas da indústria do espetáculo vamos chamar à discussão a GO! Walks Portugal, com a Sara e o Nuno (a outra metade da GWP e dos THÜNNDRESS) e tentar responder a uma dúvida premente: será uma fatalidade do destino todos os patrões serem assim? Sempre deixando bem vincada a diferença titânica de escala para uma empresa como a Everything Is New. Empresas com dimensões diferentes têm necessariamente modelos de funcionamento diversos. No entanto, mais importante do que comparar PMEs com micro-empresas, importa aqui comparar formas diferentes de olhar para a sociedade, com tudo o que isso acarreta em termos sociais e humanos. Porque a responsabilidade social não pode estar refém do volume de receitas.
Sem rodeios nem falinhas mansas vamos começar já ao ataque. Vocês sentem o estigma de ser patrões? As pessoas olham para vocês na rua e apupam-vos? Ou quando sobem a um palco com a vossa banda cospem com escárnio: “Olha os empresários! Bandidos!!!” Acontece-vos assim tantas vezes? “Nada disso!” Sara responde com uma gargalhada. “Eu nem sei bem o que significa o estigma de ser patrão”, confessa. “Limitei-me a acordar um dia e decidir que ia fazer só o que gostava e isso por acaso implicou abrir uma empresa. Nessa altura já andava a dar uns toques com o pessoal, num ambiente ainda muito subterrâneo (literalmente, uma garagem num piso -5 abaixo do Rio Mondego)”. O underground – mais do que a idade – é um posto. “Acho que como era muito nova (ainda sou, mas menos!) os outros patrões de negócios relacionados não me levavam muito a sério… mas eu sabia o que queria fazer e felizmente tive que lhes mostrar que estavam errados! Claro que ser empresária tem as suas implicações no que respeita ao tempo disponível para uma banda: tempo de medida temporal, mas também de disponibilidade mental, por isso é natural que as coisas não fluam tão rapidamente quanto eu gostaria”. Nuno não resiste em meter o bedelho. “Apesar da pergunta estar no plural quero esclarecer que não sou patrão… na realidade sou um escravo do Heavy Metal, e é assim que vai ser até ao final dos tempos!”. Para quem quiser entender, isto é todo um Manifesto.
Numa sociedade em que só é permitido discutir mediante a apresentação de uma lista muito rígida de tópicos, devidamente numerados (estou a aprender com os melhores), se calhar o mais importante é saber qual é – afinal de contas – o objectivo para a GO! Walks Portugal. Crescer o máximo possível?… Se é que isso é humanamente possível sem rebentar. Fazer um franchising da marca, uma Mcdonaldização da empresa? Ou na expressão mais eclarecedora de todas, “total global domination”? (13) Como é que se olha para esta total e infindável obsessão com o dinheiro/lucro por parte de toda a gente? “É interessante perguntares-me isso porque eu cheguei a ter uma proposta para me comprarem 51% da empresa e fazê-la algo “grande” ao estilo “total global domination”. Recusei prontamente.” Está aqui um belo exemplo do Heavy Metal como movimento com vários tentáculos e que está em oposição constante à obediência perfeita preconizada por muitas confissões de maior ou menor grau de religiosidade. Os pedagogos da nossa praça que defendem que é importante dizer não às criancinhas deviam ensinar aos mais desprevenidos que a palavra NÃO é a palavra mais importante que algum dia alguém pode aprender. “O meu objetivo é apenas fazer o que gosto e quando as coisas se tornam demasiado grandes o teu controle sobre o rumo delas perde-se pelo caminho. A empresa tem sido muito bem sucedida e bem sei que poderia ser maior mas perderia o encanto para mim. Eu gosto de poder deitar a cabeça na almofada à noite e se não estiver satisfeita com alguma coisa poder mudá-la no dia a seguir sem ter que dar satisfações a ninguém. De que me vale fazer muito dinheiro e depois não ter tempo para realmente usufruir dele? Ou usá-lo da forma errada (a comprar coisas desnecessárias para parecer isto ou aquilo…). Deixem-me só riscar aqui a próxima questão. Não vale a pena perguntar se o tédio da quarentena foi combatido com a aquisição de um dos 368 novos Porsches que foram vendidos no nosso país tão assolado por esta grande crise económica. (14) ”Por experiência própria, quem tem empresas maiores e faz mais dinheiro é quem tem mais dívidas e uma vida demasiado embrulhada. Quer dizer, se eles acharem que são felizes dessa forma tudo bem. Mas não é para mim. Para mim a verdadeira riqueza mede-se por aquilo que és e não pelo que aparentas ser ou ter: é teres pouco e dares valor, poderes apreciar e teres disponibilidade mental para agradecer e mostrá-lo quando houver realmente necessidade. Esta forma de pensar é perigosíssima. Já imaginaram se isto viraliza (eu tento alargar o léxico)? Que seria da economia mundial? O que seria do sistema perfeito em que vivemos se as pessoas passassem a adquirir apenas aquilo que efectivamente necessitam? Kháos!
A relação que o patrão tem com os seus empregados diz muito sobre o tipo de pessoa que é. Se são tratados como moços de recados, macaquinhos que têm como única e exclusiva função carregar no botão amarelo sempre ao segundo 33 de cada minuto ou o carinho do termo “colaborador”, uma tentativa um bocado pulha de disfarçar um desengajamento que é absoluto. Se existe trabalho para fazer nada mais lógico do que contratar alguém mas há quem ache muito mais benéfico para toda a gente contratar ao dia, quando calhar, como no notável «Ladri di Biciclette», filme de 1948 do grande mestre italiano De Sica. Isto é que é Liberdade, com toda a gente a fazer o seu trabalhinho, sem amarras, num mundo mágico onde todos somos empreendedores à portuguesa. Este sacudir da água do capote é muito conveniente quando surgem os primeiros obstáculos no meio da estrada dos tijolos amarelos ou não estivesse mais do que provado que a precariedade faz as pessoas trabalhar com mais afinco.
“Eu quando me refiro a eles para pessoas de fora digo “colaboradores”, na realidade eles colaboram comigo, lado a lado, a fazer crescer a empresa e satisfazer os nossos viajantes (poderia chamar-lhe clientes, mas não gosto também)”. Citando Monty Python, “You’re no fun anymore… “Se calhar é porque essa nomenclatura está tão presente hoje em dia mas independentemente disso faço questão de dar, sempre que possível, contratos que permitam um vínculo sólido à empresa: prefiro que sejamos poucos mas bons, satisfeitos e interventivos. Quero que quem trabalha comigo tenha proteção social, para que possa também ter liberdade e segurança mesmo quando chegam momentos de maior aperto como crises ou esta situação do Covid-19.” Isso é tudo muito bonito mas se as empresas se começam a preocupar com estas coisas estão a tirar o pão da boca da Bélinha Xonet e aos mecenas da filantropia beatificamente benzida. “Eu própria fui precária por muitos anos, fui enganada por muitas pessoas e – quando não fui – sinto que fui tratada como se fosse apenas uma peça de um puzzle que poderia ser descartada e substituída a qualquer momento. Isso não me incentivou minimamente, aliás eu saltei de trabalho para trabalho porque sentia que não estava a fazer nada de importante ou especial e que as minhas sugestões não valiam nada. Ali a questão nem se prendeu tanto com o que ganhava: sempre tive contratos horríveis (ou nem tive…) e muitas vezes nem cheguei a ver dinheiro. O que eu queria mesmo era entrar num sítio para trabalhar, sentir que fazia falta e que podia dar boas contribuições e isso obviamente traria clientes dispostos a pagar e consequentemente permitiria que me remunerassem o que era devido!!! É a lógica da batata em funcionamento, mas pelos vistos temos muitos empresários que julgam já ter feito o puré sem batatas…”. Isso chama-se inovação. Puré de batata 6G, com o selo de qualidade do Vale do Silicone. Stars & Stripes! 'Murica – fuck yeah!
Nuno mete alguma ordem no raciocínio. “Eu acho que o que a Sara quer dizer quando se refere a quem trabalha com ela é que somos todos “colegas”. Mas independentemente das nomenclaturas o que interessa são as condições e essas terão de ser sempre as melhores possíveis. Só assim é que as pessoas podem dar o seu melhor! Se alguém vive em sobressalto por não saber como vai pagar as contas no mês seguinte porque o contrato está a espirar então será muito difícil que essa pessoa possa fazer um bom trabalho”. Isto é assim tão difícil de compreender? A sério. É? “Isto é exatamente como nas bandas, nem todos temos as mesmas pretensões nem as mesmas capacidades mas no fim só conseguimos ser tão bons quanto o nosso elo mais fraco. Se todos nos entreajudarmos para que possamos superar individualmente os nossos limites isso só irá trazer vantagens para o coletivo”. Estamos a falar de empresas, de bandas mas podíamos estar a falar do próprio modelo de sociedade – não deixar ninguém ficar para trás.
Mas isto é um modelo profissional controverso ou não vivêssemos num país de malandros. Gente que não quer trabalhar, que prefere estar no subsídio de desemprego, como dizia esse mega-gestor, cuja carreira é um exemplo de honestidade acima de qualquer suspeita, o grande Ricardo Salgado. (15) Vamos lá ser sinceros. Em Portugal trabalha-se muito pouco. Vocês não notam que está sempre tudo a olhar para o relógio à espera que chegue a hora de saída? Ou aquela célebre conversa de circunstância de velhos amigos/conhecidos que se encontram na pausa para o almoço e um olha para o relógio com uma expressão dolorosa e o outro pergunta: “vais trabalhar?” ao que o primeiro replica com resignação: “Tem que ser”. Esta é a mão de obra de um país fantástico que as pessoas não sabem apreciar convenientemente. Temos os melhores pastéis de nata do mundo e ainda se queixam. Ver-gonha, são uma vergonha! Mas se há este desinteresse generalizado no trabalho qual será a razão? Não devíamos estar gratos por termos um trabalhinho, por termos a dignidadezinha de ganhar um dinheirinho para meter comidinha na mesinha? O Dialecto de Centro de Saúde devia ser património da Humanidade. “Acho que generalizar – seja para o que for – não é correto” Sara discorda. “Se em Portugal se trabalhasse pouco, não tínhamos tantas empresas bem-sucedidas e clientes/público satisfeito. Em todo o lado há bons e maus trabalhadores (gestores/proprietários incluídos) e o que é de lamentar é que muitos deles provavelmente não são bons no que fazem porque não receberam a formação devida e não entendem quais são os reais objetivos da empresa. Na minha área por exemplo (Animação Turística) não basta uma pessoa gostar de passear ou ter tido aulas de História na escola… e há muito pouca noção disso” Ai não? E aquelas free tours que pululam por todo o lado? Free tours com avantajada gorjeta… voluntária, claro. “Quer dizer! Pode bastar, mas depois dá mau resultado! Se a pessoa estiver tão concentrada a olhar para o relógio é mau sinal, e para mim só tem duas explicações: ou é sinal que realmente não se justifica o posto de trabalho nos moldes em que foi contratado OU que a pessoa anda às aranhas e não sabe o que está ali a fazer”. Também pode haver outra razão mas já lá vamos daqui a nada. “Eu geralmente distraio-me com as horas (e o meu pessoal também) porque há sempre tanta coisa para tratar! E isso não é uma coisa má: toda a gente sabe que caso não tenhamos outros compromissos nesse dia, apenas significa que compensamos as horas de descanso em dias mais tranquilos… e caso tenhamos outros compromissos, significa que pedimos gentilmente aos clientes para terem paciência que respondemos mais para a frente! A única forma de alguém que trabalha sentir gratidão é chegar a casa ao final do dia e estar de consciência tranquila que fez tudo o que estava ao seu alcance para as coisas correrem bem, e o dinheiro vai aparecer dessa forma e vai ter certamente comida na mesa.” Se o dinheiro aparecer já não é mau. Se o salário for justo, na medida das possibilidades reais da empresa, ainda melhor. “Na maior parte dos casos essa consciência parte de uma relação próxima com a chefia, em que lhes é transmitido optimismo e há uma transparência no que respeita às metas pretendidas e cumpridas da empresa”.
Na vossa opinião, a relação entre carga horária e produtividade é assim tão clara? Não tanto no vosso caso específico mas noutros sectores concordam que quanto mais horas se trabalha maior é a produtividade? “No nosso caso específico não é de todo clara e por isso é que não faço questão que o meu pessoal trabalhe em horários fixos nem ando – honestamente – atrás deles a contabilizar todas as horas que fazem ou não fazem. Vamos falando sobre o que há para fazer e eles gerem o horário da melhor forma, sendo que o atendimento aos viajantes é a prioridade e o resto vai-se fazendo nas restantes horas se assim for possível. A única razão pela qual temos uma folha de horário é porque é obrigatório por lei. Em outros negócios, caso se trate de atendimento ao público entendo que haja um horário fixo e isso poderá influenciar em determinadas alturas haver mais ou menos procura mas nem sempre será reflexo de haver maior ou menor produtividade por parte do trabalhador. No caso de não haver um atendimento ao público nem vejo necessidade de haver horários fixos, logicamente desde que o trabalho esteja feito para o patrão tanto faz se demoraram 4 ou 8 horas a fazer, mas pode fazer muita diferença para a disponibilidade mental do trabalhador!”. E acrescenta uma analogia com a sua – vou usar uma expressão muito querida na nossa cena metálica underground – carreira musical. “Posso fazer a comparação no meu caso como vocalista: não posso cantar 8 horas por dia e esperar que no dia seguinte esteja tudo bem com a minha voz e fazer o mesmo. Tenho que fazer treinos curtos mas bem feitos, descansar e aprender a ouvir o meu corpo, para não desgastar a voz. Já me basta aqueles dias que passo, efetivamente, 8 horas a falar com os viajantes! Infelizmente isso afeta-me muitas vezes quando depois é hora de cantar e tratar das coisas da banda. Passa-se a mesma coisa com a cabeça das pessoas em qualquer trabalho. Acontece com alguma frequência chegarmos a meio de um dia de trabalho e irmos todos para casa antes do fim do horário estipulado, até porque a recuperação para o dia seguinte é tão ou mais importante do que estar no escritório a olhar para as paredes”. Agora há um conceito que explica muito bem este fenómeno da disponibilidade mental ou da falta dela – é o chamado burnout. Felizmente há variadíssimas terapias para o debelar, seja através de umas rezas com cristais, seja através de psicoterapia e umas benzeduras, tudo num ambiente muito luzidio e positivo, inspirado em práticas milenares (tão antigas, tão antigas cujas memórias da sua origem se perdem nas brumas do tempo – um tempo com menos de 100 anos!!!) de promoção do bem-estar e do desenvolvimento humano-reikiano. E estimula a economia, alimentando a indústria da felicidade. Porque se não sabes lidar com a pressão o problema é teu.
E por falar em (o)pressão nada melhor do que avançar para o monstro do Estado, essa criatura mitológica que faz o ataque fulminante de uma jibóia parecer um abraço carinhoso. Quantas vezes por dia utilizam a frase “há Estado a mais”? Isto não seria tudo uma maravilha se houvesse a “liberdade” da “sociedade civil” poder estar envolvida em “todos” os sectores de actividade? Porque se certos sectores estiverem vedados ao sector privado isso abre um precedente perigosíssimo. Seria a mesma coisa do que viver submetido à tirania de um par de botas vermelhas – Tarrenego! Sara tenta puxar pela moleirinha. “Acho que nunca disse isso. E nem te vou repetir, para não dizer,” acrescenta com um sorriso. “Isto é obviamente uma visão sócio-económico/política por isso podíamos ficar aqui a discutir o dia todo mas dou-te a minha opinião pessoal. Nem toda a gente tem o mesmo nível de educação, princípios e conhecimentos que lhes permita gerir o que quer que seja com eficiência e de forma justa completamente sozinhos. Isso aplica-se a pessoas que estão no poder (e quando digo poder digo Estado E Empresas). O Estado permite que algumas pessoas, que foram nomeadas por milhares de pessoas, estejam de olhos abertos e ouvidos atentos para apontar injustiças e irregularidades quando existem essas suspeitas. Por muito que hajam representantes lá pelo meio que tenham uma agenda pessoal, haverá sempre a possibilidade de outros a contraporem. Nos sectores privados é difícil alguém contrapor agendas pessoais a não ser que a legislação esteja bem feita e haja alguma denúncia…. e todos sabemos como isso funciona e qual é o resultado, senão nem teríamos estado aqui a discutir justiça laboral”. Mas a liberdade? A pinguinha na cueca com a perspectiva da autorregulação dos Mercados…
Uma água gelada para fazer baixar a tensão e voltamos a centrar a conversa naquilo que efectivamente nos traz aqui hoje, que são as tão propaladas políticas culturais. Um termo um bocado idiota porque num mundo perfeito em que não andasse meio mundo a vigarizar meio mundo (quem fez a conta a estas proporções percebe tanto de matemática como a intelligentsia metálica percebe de Prog) havia condições para uma criação artística completamente livre de quaisquer condicionalismos económicos. Enquanto tal não acontece, se calhar não há outra alternativa senão o Estado ter algum papel (por pequeno que seja) não na criação de políticas culturais no sentido estrito do termo mas na criação de condições para essa mesma criação artística. Quer dizer… a alternativa até existe. Existe e está bem presente. É deixar navegar o navio ao sabor da corrente do interesse comercial. A máxima não dá dinheiro, não se faz. “Vejamos…” começa Sara. “Eu gosto de partir do princípio que um artista na sua génese não cria algo para fazer dinheiro. Cria porque largou asas à imaginação, sentiu-se inspirado por alguma coisa, e construiu algo genuíno. Isso não significa que essa criação dê dinheiro e obviamente que leva tempo a pô-la cá para fora e falha-se no percurso. Há um investimento grande por parte do artista. Além disso quem gostou do trabalho pode não ter como contribuir, ou podem não haver pessoas suficientes para apoiar esse artista, ou pode dar-se o caso de ser uma obra de arte que não se possa vender infinitamente. Parece-me óbvio que o Estado deverá entrar na equação nestes casos: o artista precisa de continuar a existir, ter saúde e um tecto para continuar a criar senão é lógico que as pessoas não poderão continuar a beneficiar do trabalho dele”. Puxando as nossas sardinhas para mais perto das brasas, como é que isso se processa dentro deste mundo das bandas? “Pessoalmente, eu até hoje não fiz dinheiro nenhum com a minha banda e já investi muito dinheiro nela. Não sinto que tenha “gasto” dinheiro, mas sinto que trabalhei noutras coisas para poder financiar a banda quando poderia estar só a fazer aquilo. O que tive em troca são as excelentes experiências, as amizades que fiz e o consolo de saber que fiz alguma coisa única de que me posso orgulhar. Se eu tivesse ajudas financeiras obviamente poderia fazer muito mais e melhor, poderia viver PARA a arte (e não DA arte): e isso para mim seria suficiente. Para as bandas existem coisas tão simples em que o Estado tem condições de apoiar, como a existência de salas de ensaio, mais concertos, concessão de licenças e facilitação no acesso a espaços públicos para atuações”.
A relação que o patrão tem com os seus empregados diz muito sobre o tipo de pessoa que é. Se são tratados como moços de recados, macaquinhos que têm como única e exclusiva função carregar no botão amarelo sempre ao segundo 33 de cada minuto ou o carinho do termo “colaborador”, uma tentativa um bocado pulha de disfarçar um desengajamento que é absoluto. Se existe trabalho para fazer nada mais lógico do que contratar alguém mas há quem ache muito mais benéfico para toda a gente contratar ao dia, quando calhar, como no notável «Ladri di Biciclette», filme de 1948 do grande mestre italiano De Sica. Isto é que é Liberdade, com toda a gente a fazer o seu trabalhinho, sem amarras, num mundo mágico onde todos somos empreendedores à portuguesa. Este sacudir da água do capote é muito conveniente quando surgem os primeiros obstáculos no meio da estrada dos tijolos amarelos ou não estivesse mais do que provado que a precariedade faz as pessoas trabalhar com mais afinco.
“Eu quando me refiro a eles para pessoas de fora digo “colaboradores”, na realidade eles colaboram comigo, lado a lado, a fazer crescer a empresa e satisfazer os nossos viajantes (poderia chamar-lhe clientes, mas não gosto também)”. Citando Monty Python, “You’re no fun anymore… “Se calhar é porque essa nomenclatura está tão presente hoje em dia mas independentemente disso faço questão de dar, sempre que possível, contratos que permitam um vínculo sólido à empresa: prefiro que sejamos poucos mas bons, satisfeitos e interventivos. Quero que quem trabalha comigo tenha proteção social, para que possa também ter liberdade e segurança mesmo quando chegam momentos de maior aperto como crises ou esta situação do Covid-19.” Isso é tudo muito bonito mas se as empresas se começam a preocupar com estas coisas estão a tirar o pão da boca da Bélinha Xonet e aos mecenas da filantropia beatificamente benzida. “Eu própria fui precária por muitos anos, fui enganada por muitas pessoas e – quando não fui – sinto que fui tratada como se fosse apenas uma peça de um puzzle que poderia ser descartada e substituída a qualquer momento. Isso não me incentivou minimamente, aliás eu saltei de trabalho para trabalho porque sentia que não estava a fazer nada de importante ou especial e que as minhas sugestões não valiam nada. Ali a questão nem se prendeu tanto com o que ganhava: sempre tive contratos horríveis (ou nem tive…) e muitas vezes nem cheguei a ver dinheiro. O que eu queria mesmo era entrar num sítio para trabalhar, sentir que fazia falta e que podia dar boas contribuições e isso obviamente traria clientes dispostos a pagar e consequentemente permitiria que me remunerassem o que era devido!!! É a lógica da batata em funcionamento, mas pelos vistos temos muitos empresários que julgam já ter feito o puré sem batatas…”. Isso chama-se inovação. Puré de batata 6G, com o selo de qualidade do Vale do Silicone. Stars & Stripes! 'Murica – fuck yeah!
Nuno mete alguma ordem no raciocínio. “Eu acho que o que a Sara quer dizer quando se refere a quem trabalha com ela é que somos todos “colegas”. Mas independentemente das nomenclaturas o que interessa são as condições e essas terão de ser sempre as melhores possíveis. Só assim é que as pessoas podem dar o seu melhor! Se alguém vive em sobressalto por não saber como vai pagar as contas no mês seguinte porque o contrato está a espirar então será muito difícil que essa pessoa possa fazer um bom trabalho”. Isto é assim tão difícil de compreender? A sério. É? “Isto é exatamente como nas bandas, nem todos temos as mesmas pretensões nem as mesmas capacidades mas no fim só conseguimos ser tão bons quanto o nosso elo mais fraco. Se todos nos entreajudarmos para que possamos superar individualmente os nossos limites isso só irá trazer vantagens para o coletivo”. Estamos a falar de empresas, de bandas mas podíamos estar a falar do próprio modelo de sociedade – não deixar ninguém ficar para trás.
Mas isto é um modelo profissional controverso ou não vivêssemos num país de malandros. Gente que não quer trabalhar, que prefere estar no subsídio de desemprego, como dizia esse mega-gestor, cuja carreira é um exemplo de honestidade acima de qualquer suspeita, o grande Ricardo Salgado. (15) Vamos lá ser sinceros. Em Portugal trabalha-se muito pouco. Vocês não notam que está sempre tudo a olhar para o relógio à espera que chegue a hora de saída? Ou aquela célebre conversa de circunstância de velhos amigos/conhecidos que se encontram na pausa para o almoço e um olha para o relógio com uma expressão dolorosa e o outro pergunta: “vais trabalhar?” ao que o primeiro replica com resignação: “Tem que ser”. Esta é a mão de obra de um país fantástico que as pessoas não sabem apreciar convenientemente. Temos os melhores pastéis de nata do mundo e ainda se queixam. Ver-gonha, são uma vergonha! Mas se há este desinteresse generalizado no trabalho qual será a razão? Não devíamos estar gratos por termos um trabalhinho, por termos a dignidadezinha de ganhar um dinheirinho para meter comidinha na mesinha? O Dialecto de Centro de Saúde devia ser património da Humanidade. “Acho que generalizar – seja para o que for – não é correto” Sara discorda. “Se em Portugal se trabalhasse pouco, não tínhamos tantas empresas bem-sucedidas e clientes/público satisfeito. Em todo o lado há bons e maus trabalhadores (gestores/proprietários incluídos) e o que é de lamentar é que muitos deles provavelmente não são bons no que fazem porque não receberam a formação devida e não entendem quais são os reais objetivos da empresa. Na minha área por exemplo (Animação Turística) não basta uma pessoa gostar de passear ou ter tido aulas de História na escola… e há muito pouca noção disso” Ai não? E aquelas free tours que pululam por todo o lado? Free tours com avantajada gorjeta… voluntária, claro. “Quer dizer! Pode bastar, mas depois dá mau resultado! Se a pessoa estiver tão concentrada a olhar para o relógio é mau sinal, e para mim só tem duas explicações: ou é sinal que realmente não se justifica o posto de trabalho nos moldes em que foi contratado OU que a pessoa anda às aranhas e não sabe o que está ali a fazer”. Também pode haver outra razão mas já lá vamos daqui a nada. “Eu geralmente distraio-me com as horas (e o meu pessoal também) porque há sempre tanta coisa para tratar! E isso não é uma coisa má: toda a gente sabe que caso não tenhamos outros compromissos nesse dia, apenas significa que compensamos as horas de descanso em dias mais tranquilos… e caso tenhamos outros compromissos, significa que pedimos gentilmente aos clientes para terem paciência que respondemos mais para a frente! A única forma de alguém que trabalha sentir gratidão é chegar a casa ao final do dia e estar de consciência tranquila que fez tudo o que estava ao seu alcance para as coisas correrem bem, e o dinheiro vai aparecer dessa forma e vai ter certamente comida na mesa.” Se o dinheiro aparecer já não é mau. Se o salário for justo, na medida das possibilidades reais da empresa, ainda melhor. “Na maior parte dos casos essa consciência parte de uma relação próxima com a chefia, em que lhes é transmitido optimismo e há uma transparência no que respeita às metas pretendidas e cumpridas da empresa”.
Na vossa opinião, a relação entre carga horária e produtividade é assim tão clara? Não tanto no vosso caso específico mas noutros sectores concordam que quanto mais horas se trabalha maior é a produtividade? “No nosso caso específico não é de todo clara e por isso é que não faço questão que o meu pessoal trabalhe em horários fixos nem ando – honestamente – atrás deles a contabilizar todas as horas que fazem ou não fazem. Vamos falando sobre o que há para fazer e eles gerem o horário da melhor forma, sendo que o atendimento aos viajantes é a prioridade e o resto vai-se fazendo nas restantes horas se assim for possível. A única razão pela qual temos uma folha de horário é porque é obrigatório por lei. Em outros negócios, caso se trate de atendimento ao público entendo que haja um horário fixo e isso poderá influenciar em determinadas alturas haver mais ou menos procura mas nem sempre será reflexo de haver maior ou menor produtividade por parte do trabalhador. No caso de não haver um atendimento ao público nem vejo necessidade de haver horários fixos, logicamente desde que o trabalho esteja feito para o patrão tanto faz se demoraram 4 ou 8 horas a fazer, mas pode fazer muita diferença para a disponibilidade mental do trabalhador!”. E acrescenta uma analogia com a sua – vou usar uma expressão muito querida na nossa cena metálica underground – carreira musical. “Posso fazer a comparação no meu caso como vocalista: não posso cantar 8 horas por dia e esperar que no dia seguinte esteja tudo bem com a minha voz e fazer o mesmo. Tenho que fazer treinos curtos mas bem feitos, descansar e aprender a ouvir o meu corpo, para não desgastar a voz. Já me basta aqueles dias que passo, efetivamente, 8 horas a falar com os viajantes! Infelizmente isso afeta-me muitas vezes quando depois é hora de cantar e tratar das coisas da banda. Passa-se a mesma coisa com a cabeça das pessoas em qualquer trabalho. Acontece com alguma frequência chegarmos a meio de um dia de trabalho e irmos todos para casa antes do fim do horário estipulado, até porque a recuperação para o dia seguinte é tão ou mais importante do que estar no escritório a olhar para as paredes”. Agora há um conceito que explica muito bem este fenómeno da disponibilidade mental ou da falta dela – é o chamado burnout. Felizmente há variadíssimas terapias para o debelar, seja através de umas rezas com cristais, seja através de psicoterapia e umas benzeduras, tudo num ambiente muito luzidio e positivo, inspirado em práticas milenares (tão antigas, tão antigas cujas memórias da sua origem se perdem nas brumas do tempo – um tempo com menos de 100 anos!!!) de promoção do bem-estar e do desenvolvimento humano-reikiano. E estimula a economia, alimentando a indústria da felicidade. Porque se não sabes lidar com a pressão o problema é teu.
E por falar em (o)pressão nada melhor do que avançar para o monstro do Estado, essa criatura mitológica que faz o ataque fulminante de uma jibóia parecer um abraço carinhoso. Quantas vezes por dia utilizam a frase “há Estado a mais”? Isto não seria tudo uma maravilha se houvesse a “liberdade” da “sociedade civil” poder estar envolvida em “todos” os sectores de actividade? Porque se certos sectores estiverem vedados ao sector privado isso abre um precedente perigosíssimo. Seria a mesma coisa do que viver submetido à tirania de um par de botas vermelhas – Tarrenego! Sara tenta puxar pela moleirinha. “Acho que nunca disse isso. E nem te vou repetir, para não dizer,” acrescenta com um sorriso. “Isto é obviamente uma visão sócio-económico/política por isso podíamos ficar aqui a discutir o dia todo mas dou-te a minha opinião pessoal. Nem toda a gente tem o mesmo nível de educação, princípios e conhecimentos que lhes permita gerir o que quer que seja com eficiência e de forma justa completamente sozinhos. Isso aplica-se a pessoas que estão no poder (e quando digo poder digo Estado E Empresas). O Estado permite que algumas pessoas, que foram nomeadas por milhares de pessoas, estejam de olhos abertos e ouvidos atentos para apontar injustiças e irregularidades quando existem essas suspeitas. Por muito que hajam representantes lá pelo meio que tenham uma agenda pessoal, haverá sempre a possibilidade de outros a contraporem. Nos sectores privados é difícil alguém contrapor agendas pessoais a não ser que a legislação esteja bem feita e haja alguma denúncia…. e todos sabemos como isso funciona e qual é o resultado, senão nem teríamos estado aqui a discutir justiça laboral”. Mas a liberdade? A pinguinha na cueca com a perspectiva da autorregulação dos Mercados…
Uma água gelada para fazer baixar a tensão e voltamos a centrar a conversa naquilo que efectivamente nos traz aqui hoje, que são as tão propaladas políticas culturais. Um termo um bocado idiota porque num mundo perfeito em que não andasse meio mundo a vigarizar meio mundo (quem fez a conta a estas proporções percebe tanto de matemática como a intelligentsia metálica percebe de Prog) havia condições para uma criação artística completamente livre de quaisquer condicionalismos económicos. Enquanto tal não acontece, se calhar não há outra alternativa senão o Estado ter algum papel (por pequeno que seja) não na criação de políticas culturais no sentido estrito do termo mas na criação de condições para essa mesma criação artística. Quer dizer… a alternativa até existe. Existe e está bem presente. É deixar navegar o navio ao sabor da corrente do interesse comercial. A máxima não dá dinheiro, não se faz. “Vejamos…” começa Sara. “Eu gosto de partir do princípio que um artista na sua génese não cria algo para fazer dinheiro. Cria porque largou asas à imaginação, sentiu-se inspirado por alguma coisa, e construiu algo genuíno. Isso não significa que essa criação dê dinheiro e obviamente que leva tempo a pô-la cá para fora e falha-se no percurso. Há um investimento grande por parte do artista. Além disso quem gostou do trabalho pode não ter como contribuir, ou podem não haver pessoas suficientes para apoiar esse artista, ou pode dar-se o caso de ser uma obra de arte que não se possa vender infinitamente. Parece-me óbvio que o Estado deverá entrar na equação nestes casos: o artista precisa de continuar a existir, ter saúde e um tecto para continuar a criar senão é lógico que as pessoas não poderão continuar a beneficiar do trabalho dele”. Puxando as nossas sardinhas para mais perto das brasas, como é que isso se processa dentro deste mundo das bandas? “Pessoalmente, eu até hoje não fiz dinheiro nenhum com a minha banda e já investi muito dinheiro nela. Não sinto que tenha “gasto” dinheiro, mas sinto que trabalhei noutras coisas para poder financiar a banda quando poderia estar só a fazer aquilo. O que tive em troca são as excelentes experiências, as amizades que fiz e o consolo de saber que fiz alguma coisa única de que me posso orgulhar. Se eu tivesse ajudas financeiras obviamente poderia fazer muito mais e melhor, poderia viver PARA a arte (e não DA arte): e isso para mim seria suficiente. Para as bandas existem coisas tão simples em que o Estado tem condições de apoiar, como a existência de salas de ensaio, mais concertos, concessão de licenças e facilitação no acesso a espaços públicos para atuações”.
Nuno, por seu lado, deixa bem claro que não aprendeu muito com as mais bem sucedidas bandas da nossa praça, cuja primeira lição é sempre parecer mais do que aquilo que se é realmente. “Eu não tenho uma grande reflexão feita sobre o assunto” para logo a seguir emendar. “Mas se puder mandar umas postas relativamente à intervenção do Estado acho que deveria passar por dar condições a todas as pessoas de serem por opção ou produtores ou consumidores de cultura mais activos. Por outras palavras, permitir que qualquer um possa chegar a casa depois de um dia de trabalho e ter disponibilidade física e mental para ir produzir ou consumir cultura. Sabemos de pessoas que acordam bem cedo para ir trabalhar, gastam entre uma a duas horas em deslocações e quando chegam a casa no fim do dia estão completamente rebentadas para fazer o que quer que seja”. É para isso que servem as novelas, as tradicionais e as modernas da internet. Ou vegetar em frente à Smart TV. Um aparte: Num mundo em que tudo é inteligente, desde telefones, electrodomésticos e veículos, em que pé ficam os humanos em termos de destreza intelectual? ”Acho que o tempo dedicado ao trabalho (e aí teriam de incluir-se as deslocações e refeição) deveria ser completamente repensado de modo a permitir que a nossa contribuição social, que é o que o trabalho deveria ser acima de tudo, é adequada para que possamos ter tempo para usufruir da cultura, e esse é um âmbito onde o Estado pode intervir. Acho que se assim fosse podíamos remover por completo a ideia de que produzir arte tem de dar obrigatoriamente qualquer ganho económico, o que pessoalmente considero ser o objetivo mais desinteressante e que mais condiciona negativamente a imaginação. Se depois disso tudo houver quem consiga fazer da sua arte o seu único meio de subsistência, então não vejo à partida um problema. Tenho um caixote do lixo especial para aqueles que produzem qualquer tipo de cultura com fins meramente comerciais”.
Este é um ponto muito importante. A criação artística (seja música, escrita ou o que quiserem) se tiver como finalidade a criação de riqueza material torna-se estéril. Aliás, o próprio Richard Wagner discorreu longamente sobre isso num dos mais belos textos sobre o assunto já em 1849, no pequeno livro «A Arte e a Revolução». A riqueza que se procura atingir, no limite, terá que ser artística, isto é, quando houver algo para dizer, seja qual for a forma. Caso contrário andamos aqui a fazer alguma coisa apenas e só por fazer, sem propósito algum. Mas voltando atrás vamos lá focar-nos novamente no papel do Estado e à gritante dualidade de critérios a que podemos assistir. Nuno completa o seu raciocínio com um enigma: “E já agora, porque é que temos clubes de adoradores do amigo imaginário que praticamente não pagam impostos enquanto que até há bem pouco tempo o IVA nos bilhetes para concertos era de 13%? Nem falo dos grandes festivais porque isso é outra coisa mas certamente que esse valor pesa nos bolsos de muitos pequenos promotores. Entre contos-de-fadas para adultos e cultura não tenho dúvidas em definir o que é realmente importante!” exclama para finalizar, numa mensagem críptica que cabe a cada um de nós decifrar da melhor maneira que soubermos.
Um dos aspectos que abordámos na primeira parte deste artigo, muito bem apanhado pela nossa semi-estrela do Rock, o Senhor Covões, foi a conversa recorrente das contas do Estado e tal. Isto está muito mau, é preciso ter cuidado onde se gasta (não é investimento, é esbanjar recursos). Se bem se lembram foi avançada a ideia que se calhar o melhor para a nossa ditosa pátria era meter as PMEs a mandar nisto tudo. Porque o que é que pode correr mal se levarmos à letra a expressão donos disto tudo? E a ideia de gerir um país como se fosse uma empresa? Daquelas mesmo à patrão, de barriga saliente e charuto nas beiças, ao melhor estilo da primeira metade do século XX. “Essa tua descrição transportou-me para as criações do Bordallo Pinheiro! E imagina só, ele viveu no século XIX… há coisas que nunca mudam, pelos vistos”. Sara estica a memória… “Tenho mesmo que pensar nisto como uma coisa cómica, para não ficar irritada, porque já estamos no século XXI. A imagem de gerir um país como se fosse uma empresa não me repugna se for uma empresa como a minha mas já me faz caso se for uma empresa em que há hierarquias bem estabelecidas e quem está lá em cima se comporta como se quem está mais em baixo possa ser espezinhado, caso isso seja necessário para atingir agendas pessoais”. Como é que é aquele slogan partidário? “Primeiro nós – depois os outros”. Ao que os Pink Floyd contrapõem: “Us & Them - and after all we're only ordinary men”. É uma questão de escolha, basicamente, em que escolhemos as citações que mais nos tocam.
Como a maioria das pessoas que procuram a GO! Walks Portugal chegam do estrangeiro, “cerca de 98%, maioritariamente dos EUA, Canadá, Austrália mas também europeus (espanhóis, holandeses, alemães e belgas, principalmente) e alguns brasileiros mas numa percentagem também baixa” é fácil de perceber o impacto que o vírus está a ter: “Tínhamos algumas reservas para Setembro e Outubro (ainda temos na realidade) mas já começaram a desmarcar. Portanto continuamos a receber cancelamentos”. Isto é só um exemplo de uma pequeníssima empresa na área do Turismo Cultural no meio de uma avalanche que parece não ter fim à vista. Neste caso particular, a quebra de receitas é quase total. E a ressalva do quase é apenas porque “ainda trabalhámos uns dias em Março apesar de ter sido já a conta gotas. E desde 12 de Março estivemos sem visitas até Junho. Desde Junho até hoje fiz 5 visitas. É mesmo trabalho que não dá para pagar nada. Eram meses de muito trabalho necessários depois da época baixa que passou, que nos iam permitir equilibrar contas durante o verão e sobreviver financeiramente ao próximo inverno quando também escasseia trabalho”. Numa frase, “o resultado é catastrófico e as perspectivas não são nada optimistas”.
Partindo da sua realidade específica, Sara avança para uma análise mais abrangente, relativamente ao efeito da pandemia e das diversas formas que o mundo empresarial escolheu para a enfrentar. “Como deu para ver nesta altura de quarentena, a maior parte das empresas deste país são microempresas (como a minha) e a sociedade está muito dependente das mesmas. A economia também sofre muito quando estas empresas deixam de pagar impostos e de poder pagar aos seus trabalhadores, como se constata. Vi bem mais PME a mandar para o desemprego sem quaisquer problemas que microempresas a querer despedir os seus trabalhadores, e isto diz muito sobre o respeito pelas pessoas vs. ser tio-patinhas”. Mais uma vez, é uma questão de escolha. E as escolhas têm consequências. “No meu caso, dei umas voltas à minha vida pessoal e deixei de me remunerar para poder garantir o pagamento aos meus trabalhadores e todas as despesas necessárias, e não tive qualquer problema em chegar à conclusão que era isso ou fechar a empresa. Sem os apoios do Estado para o lay-off (ou seja, sem os impostos que pagámos no passado, menos aqueles que passam a vida a fugir e que de certeza voltaram agora de mão estendida) nesta altura, eu não teria liquidez para fazer face a uma crise desta dimensão. Afinal de contas, uma microempresa ficar sem faturar durante muitos meses põe em causa a sua viabilidade. Na área da Animação Turística é ainda pior se isso acontecer no final de uma Época Baixa, onde já há habitualmente alguma ginástica financeira para fazer face às despesas quando o volume de faturação baixa exponencialmente. Mas eu continuo a dizer que sem trabalhadores não há empresa, e certamente necessitarei da força deles quando voltarmos à carga por isso não vou descartá-los agora só para poder meter uns trocos ao bolso”.
Como espectadores atentos da realidade à nossa volta, somos bombardeados com aquela teoria que nos ensinam a toda a hora que os benefícios fiscais para as grandes empresas geram emprego à fartazana. Daquele emprego mesmo bombom. No entanto, Sara não parece muito impressionada. “Antes pelo contrário” é a reacção imediata. “O que eu vejo é os quadros dessas empresas remunerarem-se mais e criar precaridade para todos os outros trabalhadores. É assim que funciona este sistema capitalista que nitidamente não é sustentável – quem não se apercebeu disso durante a quarentena deve estar com umas vendas nos olhos”. E mais cego do que aquele que não vê é aquele que não quer ver. “O que gera emprego é dinheiro a circular e dinheiro parado em contas bancárias ou offshores não circula de certeza… e é aí onde vai parar pelo menos uma boa parte desses benefícios fiscais. Que as empresas devam poder utilizar a riqueza produzida para crescer e com isso criar mais e melhor emprego não vejo problema mas há um limite a partir do qual a acumulação é completamente contraproducente e é a partir desse limite que o dinheiro deve ser redistribuído”. Mas como empresários esse conceito de redistribuição de riqueza e justiça social não é algo que vos causa imensos pesadelos? “Pesadelos porque não acontece? Sim!”.
27.07.2020
Este é um ponto muito importante. A criação artística (seja música, escrita ou o que quiserem) se tiver como finalidade a criação de riqueza material torna-se estéril. Aliás, o próprio Richard Wagner discorreu longamente sobre isso num dos mais belos textos sobre o assunto já em 1849, no pequeno livro «A Arte e a Revolução». A riqueza que se procura atingir, no limite, terá que ser artística, isto é, quando houver algo para dizer, seja qual for a forma. Caso contrário andamos aqui a fazer alguma coisa apenas e só por fazer, sem propósito algum. Mas voltando atrás vamos lá focar-nos novamente no papel do Estado e à gritante dualidade de critérios a que podemos assistir. Nuno completa o seu raciocínio com um enigma: “E já agora, porque é que temos clubes de adoradores do amigo imaginário que praticamente não pagam impostos enquanto que até há bem pouco tempo o IVA nos bilhetes para concertos era de 13%? Nem falo dos grandes festivais porque isso é outra coisa mas certamente que esse valor pesa nos bolsos de muitos pequenos promotores. Entre contos-de-fadas para adultos e cultura não tenho dúvidas em definir o que é realmente importante!” exclama para finalizar, numa mensagem críptica que cabe a cada um de nós decifrar da melhor maneira que soubermos.
Um dos aspectos que abordámos na primeira parte deste artigo, muito bem apanhado pela nossa semi-estrela do Rock, o Senhor Covões, foi a conversa recorrente das contas do Estado e tal. Isto está muito mau, é preciso ter cuidado onde se gasta (não é investimento, é esbanjar recursos). Se bem se lembram foi avançada a ideia que se calhar o melhor para a nossa ditosa pátria era meter as PMEs a mandar nisto tudo. Porque o que é que pode correr mal se levarmos à letra a expressão donos disto tudo? E a ideia de gerir um país como se fosse uma empresa? Daquelas mesmo à patrão, de barriga saliente e charuto nas beiças, ao melhor estilo da primeira metade do século XX. “Essa tua descrição transportou-me para as criações do Bordallo Pinheiro! E imagina só, ele viveu no século XIX… há coisas que nunca mudam, pelos vistos”. Sara estica a memória… “Tenho mesmo que pensar nisto como uma coisa cómica, para não ficar irritada, porque já estamos no século XXI. A imagem de gerir um país como se fosse uma empresa não me repugna se for uma empresa como a minha mas já me faz caso se for uma empresa em que há hierarquias bem estabelecidas e quem está lá em cima se comporta como se quem está mais em baixo possa ser espezinhado, caso isso seja necessário para atingir agendas pessoais”. Como é que é aquele slogan partidário? “Primeiro nós – depois os outros”. Ao que os Pink Floyd contrapõem: “Us & Them - and after all we're only ordinary men”. É uma questão de escolha, basicamente, em que escolhemos as citações que mais nos tocam.
Como a maioria das pessoas que procuram a GO! Walks Portugal chegam do estrangeiro, “cerca de 98%, maioritariamente dos EUA, Canadá, Austrália mas também europeus (espanhóis, holandeses, alemães e belgas, principalmente) e alguns brasileiros mas numa percentagem também baixa” é fácil de perceber o impacto que o vírus está a ter: “Tínhamos algumas reservas para Setembro e Outubro (ainda temos na realidade) mas já começaram a desmarcar. Portanto continuamos a receber cancelamentos”. Isto é só um exemplo de uma pequeníssima empresa na área do Turismo Cultural no meio de uma avalanche que parece não ter fim à vista. Neste caso particular, a quebra de receitas é quase total. E a ressalva do quase é apenas porque “ainda trabalhámos uns dias em Março apesar de ter sido já a conta gotas. E desde 12 de Março estivemos sem visitas até Junho. Desde Junho até hoje fiz 5 visitas. É mesmo trabalho que não dá para pagar nada. Eram meses de muito trabalho necessários depois da época baixa que passou, que nos iam permitir equilibrar contas durante o verão e sobreviver financeiramente ao próximo inverno quando também escasseia trabalho”. Numa frase, “o resultado é catastrófico e as perspectivas não são nada optimistas”.
Partindo da sua realidade específica, Sara avança para uma análise mais abrangente, relativamente ao efeito da pandemia e das diversas formas que o mundo empresarial escolheu para a enfrentar. “Como deu para ver nesta altura de quarentena, a maior parte das empresas deste país são microempresas (como a minha) e a sociedade está muito dependente das mesmas. A economia também sofre muito quando estas empresas deixam de pagar impostos e de poder pagar aos seus trabalhadores, como se constata. Vi bem mais PME a mandar para o desemprego sem quaisquer problemas que microempresas a querer despedir os seus trabalhadores, e isto diz muito sobre o respeito pelas pessoas vs. ser tio-patinhas”. Mais uma vez, é uma questão de escolha. E as escolhas têm consequências. “No meu caso, dei umas voltas à minha vida pessoal e deixei de me remunerar para poder garantir o pagamento aos meus trabalhadores e todas as despesas necessárias, e não tive qualquer problema em chegar à conclusão que era isso ou fechar a empresa. Sem os apoios do Estado para o lay-off (ou seja, sem os impostos que pagámos no passado, menos aqueles que passam a vida a fugir e que de certeza voltaram agora de mão estendida) nesta altura, eu não teria liquidez para fazer face a uma crise desta dimensão. Afinal de contas, uma microempresa ficar sem faturar durante muitos meses põe em causa a sua viabilidade. Na área da Animação Turística é ainda pior se isso acontecer no final de uma Época Baixa, onde já há habitualmente alguma ginástica financeira para fazer face às despesas quando o volume de faturação baixa exponencialmente. Mas eu continuo a dizer que sem trabalhadores não há empresa, e certamente necessitarei da força deles quando voltarmos à carga por isso não vou descartá-los agora só para poder meter uns trocos ao bolso”.
Como espectadores atentos da realidade à nossa volta, somos bombardeados com aquela teoria que nos ensinam a toda a hora que os benefícios fiscais para as grandes empresas geram emprego à fartazana. Daquele emprego mesmo bombom. No entanto, Sara não parece muito impressionada. “Antes pelo contrário” é a reacção imediata. “O que eu vejo é os quadros dessas empresas remunerarem-se mais e criar precaridade para todos os outros trabalhadores. É assim que funciona este sistema capitalista que nitidamente não é sustentável – quem não se apercebeu disso durante a quarentena deve estar com umas vendas nos olhos”. E mais cego do que aquele que não vê é aquele que não quer ver. “O que gera emprego é dinheiro a circular e dinheiro parado em contas bancárias ou offshores não circula de certeza… e é aí onde vai parar pelo menos uma boa parte desses benefícios fiscais. Que as empresas devam poder utilizar a riqueza produzida para crescer e com isso criar mais e melhor emprego não vejo problema mas há um limite a partir do qual a acumulação é completamente contraproducente e é a partir desse limite que o dinheiro deve ser redistribuído”. Mas como empresários esse conceito de redistribuição de riqueza e justiça social não é algo que vos causa imensos pesadelos? “Pesadelos porque não acontece? Sim!”.
27.07.2020
1. The Guardian (artigo – 19.06.2020)
2. BBC Brasil (artigo – 12.07.2020)
3. Business Insider (artigo (04.06.2020)
4. Public Citizen (artigo – 07.05.2020)
5. Stat News (artigo – 08.05.2020)
6. Gilead (press release – 04.02.2020)
7. Blitz (podcast – 09.07.2020)
8. Público (artigo – 13.05.2009)
9. European Journal Of Vocational Training (no. 46 – 01.2009)
10. DW (artigo – 27.04.2016)
11. Anadolu Agency (artigo – 03.07.2020)
12. Bloomberg (artigo – 07.03.2013)
13. More Than Honey (trailer)
14. Público (artigo – 01.07.2020)
15. Jornal de Negócios (artigo – 24.05.2013)
2. BBC Brasil (artigo – 12.07.2020)
3. Business Insider (artigo (04.06.2020)
4. Public Citizen (artigo – 07.05.2020)
5. Stat News (artigo – 08.05.2020)
6. Gilead (press release – 04.02.2020)
7. Blitz (podcast – 09.07.2020)
8. Público (artigo – 13.05.2009)
9. European Journal Of Vocational Training (no. 46 – 01.2009)
10. DW (artigo – 27.04.2016)
11. Anadolu Agency (artigo – 03.07.2020)
12. Bloomberg (artigo – 07.03.2013)
13. More Than Honey (trailer)
14. Público (artigo – 01.07.2020)
15. Jornal de Negócios (artigo – 24.05.2013)